Criatividade não se cria…
Por Janice Mansur (@janice_mansur)*
Você pensava que eu ia falar “criatividade não se cria, mas se copia”? Também poderia brincar assim e, na verdade, faço isso quase constantemente. Mas o que ia dizer aqui é: “criatividade não se cria, se cultiva” para acompanhar a imagem que ilustra este artigo.
Minha inspiração inicial veio dela, porque há flores saindo de uma lâmpada, que pode representar as ideias, e o lado criativo em expansão a partir dela.
Você acha que seria capaz de treinar seu cérebro para cultivar a criatividade?
Não vamos nos aprofundar muito no que diz respeito ao aspecto científico do funcionamento cerebral, porque são tantas as pesquisas nessa área que a cada dia mais informação é acrescida a ela. Nossa intenção aqui é trazer à baila essa perspectiva do cultivo na possibilidade de desenvolver a criatividade. Você topa?
Portanto, reforço aqui que isso é uma questão também de treinamento, durante aquelas atividades que envolvem habilidades artísticas e criativas, como, por exemplo, o uso de linguagem figurada na composição de textos ou livros, tendência à improvisação quando se dança ou se toca um instrumento ou se cria algo visualmente artístico, entre outras mais. Contudo, não é só, vai muito além.
Quando eu era pequena estudei num colégio que primava pela criatividade. Tínhamos aula de teatro, de dança rítmica e uma oficina de redação baseada na criatividade, para você ver que nada cresce de lugar algum. E era incrível poder participar de coisas tão prazerosas. Então, só para lembrá-lo, se você tem filhos pequenos ofereça a ele em casa tudo de diferente que puder. Alimentos variados, leitura, música, revistinhas em quadrinhos, desenhos, muitos lápis de cor… muita vida.
A boa notícia é que você pode cultivar criatividade também
Ideias só crescem em solo fértil e quando são cultivadas. Como está seu jardim interno? Pensam alguns que ser criativo é uma característica inata por excelência, mas não é. Ela pode vir, sim, de algo que você pensou ou criou anteriormente e desenvolveu a posteriori, e geralmente você já teve algum contato com a ideia. Quando nos deparamos com a missão de criar alguma coisa, quando precisamos atribuir valor a algum objeto estético ou, até mesmo, quando exercemos o papel de escritor, quase que naturalmente, nos é exigido que sejamos criativos.
A “Querela do Antigos e Modernos” − retomada no Romantismo − que foi uma controvérsia ocorrida entre intelectuais franceses, no século XVII, mais precisamente a partir de 1687, desencadeou esse pensamento: de que é preciso romper com o passado e buscar uma autenticidade para o presente, de que não é preciso copiar o que já foi feito, mas sim tornar a arte uma capacidade criadora e inovadora. Por causa dessa história, surgiu o mito da originalidade, pois se antes os modelos eram a fonte de orientação para a construção de uma obra estética, depois disso o gênio e sua inspiração passavam a ser a fonte e origem da nova criação. O tal papo da autenticidade: sou fonte de tudo o que crio, será? Você concorda com isso? Se no início deste texto, brinquei no que diz respeito a copiar algo e não somente cultivar, é porque algo acontece por aí. Vem comigo!
Muitas pessoas copiam das outras, sim, trocando coisas mínimas por outras só para dar um start na sua criatividade e, logicamente, com o tempo vão se afastando das fontes para criar suas próprias atividades, suas obras de arte, seus livros, projetos, posts e o que queiram. Isso não é um crime. Quem diz que nunca se inspirou em algo precedente a ela, falseia com a verdade. Mas não estou aconselhando aqui para se ficar reproduzindo dancinhas na internet e ficar usando dublagens como hoje se vê tanto por aí. Para ser mais criativo é preciso se desprender de alguns conceitos e preconceitos e alçar voos, mas reproduzir o que está mais do que batido é perda de tempo, isso não vai ajudar no cultivo da sua criatividade. Ler, ver e ouvir coisas que não dizem respeito a seu universo é bem mais interessante e também abandonar o que está saturado do senso comum.
Procure ser mais observador e curioso. Coloque em cheque verdades absolutas, inclusive as suas. Arrisque pensar de forma diferente e conversar com pessoas que pensam o oposto de você, como se diz por aí, sair da caixa e olhar para as coisas do mundo, de fora. Isso pode ser transformador.
É necessário muito input. Nutrir sua mente com diversos assuntos e de variada configuração. Claro que haverá certo limite para minha compreensão, por exemplo, como não sou muito boa em matemática, o que depender dela para aprimorar minha criatividade vai ficar difícil. Daí posso fazer umas curvas e dar meus pulinhos certo?
Não dizem que errar é humano?
E é mesmo! Por isso é preciso privilegiar o processo. Como em tudo na vida, é o caminho que vai me ensinar a caminhar. Não há receita de bolo. O trabalho criativo tem altos e baixos, e requer fluxo diferenciado, dependendo de cada pessoa e como ela esteja se sentindo no momento de sua vida. O ritmo também é diferente de acordo com o projeto em que se está trabalhando e ocorre conforme o contexto em que se esteja inserido. É importante buscar outras referências e outros estilos sempre.
Continue nessa busca, claro, priorizando o que lhe dá prazer, pois criatividade diz respeito a isso principalmente: prazer. Observe a vida, os animais, as crianças, conecte-se com você mesmo. Ah, e mantenha um caderno onde você pode anotar tudo o que vier à mente. Coletar ideias é essencial para a nutrição de que falamos antes, mas capriche na seleção de material para os olhos e os ouvidos, não saia ouvindo ou lendo qualquer coisa pensando que vai inspirar você. Tem muito lixo por aí. Seja seletivo. Busque o melhor, mas não se torne um perfeccionista, pois a busca pela perfeição, estressa e destrói a criatividade. Ela demanda fluxo e liberdade. Permita-se errar muitas vezes e recomeçar. Um dia, como as pessoas dizem, “do nada”, você terá criado algo de que se orgulhará.
Na verdade, para cultivar a criatividade temos de levar uma vida criativa para nós, o que demanda um aumento da curiosidade, um alargamento de vista. Hoje, caso você não possa ir a museus, viajar por países onde a cultura é diferente da sua, você pode entrar na internet e procurar as várias maravilhas que existem online. Aventurar-se em descortinar o mundo e as coisas que há por aí, pode ajudar. Pesquisar sobre tipos de residências diferentes, modos de vida, hábitos e costumes, que não são os seus, é enriquecedor. Treinar seus conhecimentos, desenvolvendo-se em diferentes campos, como a escrita criativa, a oratória, o marketing digital, a filosofia, psicologia, e outras áreas, pode funcionar − em parte − para melhorar ainda a conectividade neural e plasticidade possibilitando a associação de ideias e um acesso mais rápido a elementos de criação quando precisamos deles.
Gostou do texto? Ajudou você a cultivar mais ideias?
Então, floresça-as com comentários, por favor. Vou gostar de saber de sua opinião.
* Janice Mansur é escritora, professora, revisora de tradução e criadora de conteúdo. Visite a autora também no site do Jornal Notícias em Português (Londres) e na Academia Niteroiense de Letras. Canal do Youtube: BETTER & Happier / Instagram: @janice_mansur
Imagem: Unsplash e @yasmin.tattooist
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