O dia em que tentaram parar o samba

Por Lourenço Marques*

A década de 1970 foi um período muito complicado para o Brasil. Vivíamos o auge da ditadura militar, com a promulgação dos Atos Institucionais, em especial o 5o ato, instituído em 1968, que cassava direitos políticos, suspendia Habeas Corpus, decretava estado de sítio, entre outros abusos de poder. 

Assim, mais do que nunca, a repressão imperava no país.

São em momentos como esses que um conceito criado por Michel Pollak surge: as memórias subterrâneas. 

Mas o que são? Em momento de exceção, onde existe um discurso oficial que quer impor uma ideia, as memórias subterrâneas são o resultado do que pensam os oprimidos e tentam de alguma maneira ir contra a memória oficial.

É um jeito de resistir a destruição da identidade de um grupo.

Quando todo o momento de exceção passa, é a hora em que elas afloram com mais força e acabam ganhando notoriedade.

Invasões no samba

O ato de invadir ensaios, forçando-os a encerrar antes era algo comum. Bastava alguma mínima suspeição de que havia alguma participação/manifestação política de algum grupo de esquerda que já era motivo, mais que bastante, para encerrar um ensaio de escola de samba.

Diversas escolas eram investigadas sobre o preceito de que o PCB (Partido Comunista Brasileiro) estava infiltrado nas agremiações, fazendo campanha política.

Eis que em 1976, a polícia, mais uma vez, invadiria um ensaio. E aí, cabe aqui uma lembrança.

Desde seus primórdios, o samba sempre foi marginalizado, chegando até a ser considerado um ato de vadiagem. 

É somente quando Getúlio Vargas assume, ainda em meados da década de 1930, que o samba começa a receber alguma atenção de maneira positiva do governo. Mas apenas porque seria usado como uma forma de criar uma identidade nacional.

No dia dessa foto, 20 de fevereiro, a Estação Primeira de Mangueira se preparava para mais um ensaio de rua. Em mais um ato autoritário, a polícia chegou para encerrar o ensaio, antes mesmo dele começar. 

Nesse momento, o gênio Cartola senta-se na frente do carro da Patrulha como forma de resistência contra aquela ação. 

Mas quem era Cartola? Por que foi tão importante essa sua ação? 

Também conhecido como Angenor de Oliveira, o grande músico, por problemas financeiros, foi morar no Morro da Mangueira ainda muito novo. Após sua mãe falecer, foi trabalhar de servente de obra e usava um chapéu de coco para se proteger do cimento que caia. Por causa do chapéu, seu apelido virou Cartola.

Foi no Morro da Mangueira que conheceu Carlos Cachaça, um grande boêmio, malandro, homem do samba. 

E foi assim que Cartola começou nesse mundo.

Foi sendo apresentado a outros bambas e, juntos, em 1923, eles decidem fundar o Bloco do Arrengueiros, que seria mais tarde, em 1928, a base para a fundação da Estação Primeira de Mangueira, uma das mais tradicionais escolas de samba do Rio de Janeiro.

A foto memorável é de Eurico Dantas.

* Lourenço Marques é integrante do Observatório de Carnaval da UFRJ, assessor de imprensa da imperatriz Leopoldinense e faz parte do time de historiadores do Samba de Bamba UK. No Instagram, @sambadebamba_uk. Facebook e YouTube: Samba de Bamba UK.

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