Lançamento do livro Memórias da Ditadura, em Bruxelas

O livro Memórias da Ditadura – Sociedade, Emigração e Resistência, de Daniel Bastos, é um trabalho singular que traz à tona aspectos muitas vezes negligenciados da história recente de Portugal, iluminando a luta pela liberdade e a resistência à ditadura através da lente do fotógrafo e oposicionista Fernando Mariano Cardeira. O lançamento da obra, que ocorre no dia 5 de abril em Bruxelas, tem um significado especial, pois é uma oportunidade para revisitar a história de um período de grande tensão e transformação, tanto em Portugal como em diversas partes do mundo, especialmente dentro das comunidades de emigrantes portugueses.
A apresentação do livro acontece na livraria La Petite Portugaise, um espaço emblemático em Bruxelas, dedicado à promoção da língua e cultura portuguesas. Este ambiente torna-se o local ideal para compartilhar uma obra que não só aborda o passado de luta contra o regime ditatorial, mas também mantém vivo o espírito de resistência e solidariedade que caracteriza a diáspora portuguesa.
A obra é uma edição bilíngue (português e inglês) que reúne o trabalho fotográfico de Fernando Mariano Cardeira, um antigo oposicionista, desertor militar, emigrante e exilado político. Suas imagens inéditas capturam momentos cruciais da história portuguesa nas décadas de 1960 e 1970, quando o país vivia sob o regime de Estado Novo, uma ditadura autoritária que cerceava liberdades e impunha grandes dificuldades sociais à população. Através de mais de 150 fotografias, o livro oferece uma visão profunda das lutas políticas e sociais da época, com destaque para os movimentos de resistência, a emigração em busca de melhores condições de vida, e a participação de militantes e ativistas no processo de resistência ao regime.
A narrativa fotográfica de Cardeira começa com um marco simbólico: as manifestações do Maio de 1968 em Paris, um evento que teve um impacto global e que influenciou diretamente a consciência política de muitos, incluindo o próprio fotógrafo. Durante esses anos de efervescência política, Cardeira começa a consolidar sua identidade política e cívica, acompanhando de perto as lutas dos estudantes e dos trabalhadores contra os regimes autoritários, mas também testemunhando a pobreza e as desigualdades sociais que caracterizavam a sociedade portuguesa. O livro não se limita a uma simples coleção de imagens; ele as utiliza como um fio condutor para explorar os complexos temas da resistência política, da emigração forçada e do exílio, que marcaram as trajetórias de muitos portugueses que buscaram escapar da repressão e das condições adversas impostas pelo regime.
O fotógrafo foi também um dos que vivenciaram a desoladora experiência da emigração forçada. Muitos portugueses, principalmente nas décadas de 1960 e 1970, emigraram para países como França, Alemanha e outros destinos europeus e americanos, à procura de uma vida melhor, longe da Guerra Colonial e da repressão política. O livro de Bastos, ao reunir o espólio fotográfico de Cardeira, vai além de uma mera documentação visual e se torna um testemunho do impacto dessa emigração nas comunidades portuguesas ao redor do mundo, como é o caso das comunidades em Bruxelas, onde a obra será apresentada. A diáspora portuguesa, com suas marcas de sofrimento, resistência e luta por justiça, emerge de forma vívida através da obra de Bastos.
A apresentação do livro contará com a presença de Maria José Gama, Presidente da Associação José Afonso em Bruxelas, que tem contribuído significativamente para a preservação e promoção da memória histórica das lutas sociais e políticas dos portugueses, especialmente no contexto da ditadura e do 25 de Abril. O historiador José Pacheco Pereira, que assina o prefácio da obra, também desempenha um papel relevante na construção e na difusão da memória histórica, tendo fundado o Ephemera, o maior arquivo privado de documentos históricos em Portugal, que desempenha um papel crucial na preservação de fontes e testemunhos desse período.

Este trabalho de Daniel Bastos se destaca também por sua relevância em relação à recente comemoração dos 50 anos do 25 de Abril, um marco na história de Portugal que resultou na Revolução dos Cravos, que derrubou a ditadura e instaurou um regime democrático no país. A obra tem o apoio institucional da Comissão Comemorativa dos 50 anos do 25 de Abril, que foca especialmente nas questões da participação política e democratização, temas que são também abordados no livro de forma profunda e reflexiva.
Memórias da Ditadura – Sociedade, Emigração e Resistência se configura como uma obra essencial para compreender as experiências de resistência e as condições que levaram muitos portugueses a lutar pela liberdade, não apenas em solo nacional, mas também em contextos internacionais. Através das lentes de Fernando Mariano Cardeira, somos convidados a olhar para o passado com um olhar crítico, consciente da importância de preservar a memória das lutas de um povo que, ao longo de décadas, nunca deixou de buscar justiça e liberdade.