Um artista brasileiro em West End na pós-pandemia
Por Marta Stephens
Março de 2020. O brasileiro Daniel Monteiro se preparava para mais uma participação no espetáculo Rei Leão, do qual fazia parte do elenco fixo desde março de 2016, tendo interpretado inúmeras vezes o personagem principal. Os ingressos estavam esgotados, como costumava ser cada dia.
“Havia comentários sobre o vírus devastando a Itália e que alguma medida drástica seria tomada, mesmo assim foi um choque”, relembra Daniel. “Os chefes vieram pessoalmente e avisaram que a partir do dia seguinte, não precisaríamos voltar ao teatro, que ficaria fechado por duas ou três semanas.”
A pandemia silenciou West End, o teatro profissional tradicionalmente encenado em Londres, considerado um dos mais altos níveis de teatro comercial no mundo de língua inglesa. Centenas de milhares de artistas e profissionais dos bastidores tiveram a carreira interrompida.
Daniel, bailarino, músico e cantor nascido em São Paulo, foi um deles. “Fui amparado pelo programa do governo e também tinha algumas economias que pude usar nesse período”, conta.
A previsão de duas a três semanas de teatro fechado não se confirmou e até julho de 2021, Daniel não voltou a subir no palco. “Um espetáculo como esse é muito caro e encená-lo com metade do público não é vantajoso”, conta.
Para se ter uma ideia, antes da pandemia o teatro recebia sua capacidade máxima de público, cerca de 1.400 pessoas por sessão do espetáculo.
Em março deste ano, o contrato de Daniel com a direção de Rei Leão foi suspenso e não foi renovado.
Artista de inúmeras qualidades, Daniel mudou o foco e já está trabalhando, desta vez fazendo um filme – uma produção inglesa que deve ser lançada daqui a um ano e meio. “Não posso dizer muito sobre o projeto, mas faço tudo nesse filme: canto, danço e interpreto”, diz.
Daniel entrou no elenco do filme como bailarino, mas ao longo das filmagens conseguiu um pequeno papel também. “Posso adiantar que é um musical sobre um super-herói.”

Workshops para mulheres empreendedoras
Outro projeto que Daniel está envolvido diz respeito à comunidade brasileiro no Reino Unido. Ele está planejando uma série de workshops voltados a mulheres empreendedoras, em parceria com o grupo Connected Women, de Londres.
Serão aulas em português e inglês (se necessário) voltadas ao desenvolvimento artístico e uso de técnicas do teatro na vida profissional e pessoal das participantes. “Esse é um projeto que está sendo desenvolvido e que vai ajudar pessoas de qualquer idade a desenvolver o potencial de comunicação”, explica. “Eu acredito que o teatro tem o poder de impulsionar as pessoas positivamente.”
Os workshops terão um pouco do que consiste a preparação de um artista profissional de musicais, com jogos teatrais e dinâmicas de grupo. Na vida real, Daniel mantém uma rotina pesada de ensaios, testes e treinos. Faz ginástica diariamente para manter a boa forma, aulas de canto, estudo de partituras (até para fazer um teste para um musical, Daniel precisa aprender as músicas executadas), aulas de dança (sapateado, jazz e balé) e, para completar a rotina, meditação e pilates. “Preciso focar na mente e no corpo”, diz.
Fácil não é, mas aos 33 anos Daniel sente que está no lugar que sempre quis. “Nós artistas também temos chefes chatos, mas sou muito grato pela espaço que conquistei.”
Sobre o Brasil, país que não visita há cinco anos, Daniel se preocupa com o futuro do mercado de teatro e de musicais. Há sete anos, quando trocou São Paulo por Londres, a capital paulista vivia um boom de musicais, com cerca de oito espetáculos da Broadway e West End encenados simultaneamente.
“Agora está bem difícil, o que não me faz ter vontade de voltar”, conta.
Futuro dos musicais
Para Daniel, o que vem no pós-pandemia será um mercado diferente, mas uma coisa não vai mudar: continuará sendo um ambiente muito competitivo. Por isso, a mensagem que ele deixa aos jovens artistas com vontade de brilhar nos musicais é simples: se preparem, estudem inglês, canto, dança, ou que tiver no radar.
“Esse é um mercado muito peculiar”, explica. “Não serei eu quem vai apontar para um ator e dizer que só conseguiu o papel porque é filho do produtor. Claro que isso acontece, mas o mercado é daqueles que se preparam.”
O que Daniel quer dizer com isso? Que favorecimentos acontecem, mas para se manter no palco é preciso dar conta do recado e mostrar qualidades que não nos são passadas como herança.
“Você pode ser filho de quem for, se não cantar, dançar e interpretar bem, se não souber se comportar no palco e nas coxias, não conseguirá espaço”, diz.
Para o futuro, os planos envolvem muita dedicação ao canto. Daniel, que sempre foi mais reconhecido pelo seu talento como bailarino, está cada dia mais apaixonado pelas aulas de canto.
“Não sei se farei shows e lançarei álbuns porque eu gosto de teatro, de estúdio de filmagem, gosto do maravilhoso mundo dos musicais”, explica.
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