Uma sobrevivente e sua missão: ajudar vítimas de violência doméstica

Quem já foi vítima de violência doméstica entenderá as motivações de Marcia McCusker para uma vida dedicada a ajudar o próximo. Marcia foi ela mesma vítima quando ainda era criança. Do trauma e das cicatrizes nasceu uma mulher destinada a dar suporte a quem precisa, em especial pessoas em situação de violência no âmbito familiar. “Transformei minha raiva nessa energia para ajudar as pessoas”, diz.

Não é um trabalho. Ela tem uma carreira bem-sucedida na área financeira de uma prestadora de serviços da BBC. “Isso aqui é uma missão”, explica.

No último ano de Direito, Marcia se prepara para um grande salto: inaugurar sua ONG Wings of Soul, organização já registrada em parceria com a advogada Márcia Blu.

Marcia McCusker e o seu inseparável mascote J.J.: “Isso não é um trabalho, é uma missão”

Para fazer esse sonho se tornar realidade, ela tem batido na porta do número 10 Downing Street e já é uma velha conhecida do primeiro-ministro Boris Jonhson. No dia 11/02, ela esteve entre os 100 convidados para um jantar na Brunel University em torno do tema violência doméstica, promovido pelo primeiro-ministro. Foi cumprimentada por Boris, que a chamou pelo nome e elogiou a atuação dela, mas não fez promessas. “Estou em negociação para voltar ao number 10 desta vez para falar exclusivamente do meu projeto”, conta.

Na entrevista a seguir, ela explica mais sobre suas motivações.

Notícias em Português – Que tipo de ajuda você oferece?

Marcia McCusker – Há muitos anos, ajudo vítimas de violência doméstica. Faço o que for necessário. Bato de porta em porta, contato advogado, já enfrentei o council. Tento dar o suporte necessário para que as vítimas procurem as autoridades, denunciem e se distanciem da violência.

Marcia com o marido Steven: apoio e paciência com uma agenda que pode incluir 19 ligações em um dia

Por que faz isso sem cobrar remuneração alguma?

Porque eu fui vítima de violência doméstica e não consegui justiça no meu caso pessoal. Sou uma sobrevivente e desde o dia em que tive uma nova chance de recomeço, nunca parei de ajudar o próximo.

Há muitos casos de violência doméstica no Reino Unido?

Em quase 20 anos de Reino Unido, já vivenciei muitas situações tristes e revoltantes. Em um caso recente, ajudei uma mulher vítima de dois relacionamentos abusivos que perdeu a guarda da filha por 20 dias por a ter colocado em risco. A conheci no hospital, de onde ela não saía após dar à luz à segunda filha porque não tinha para onde ir. Sei por conhecimento próprio que vítimas de violência doméstica são facilmente envolvidas em outras situações de violência. Trabalhei das seis da tarde às duas e meia da manhã escrevendo um “statement”. Fiz um planejamento de encaminhar o processo. Usei o Código de Direitos Humanos como argumento e conseguimos a permanência dela no país. Ouvi do juiz que a minha declaração foi brilhante.

Também já vi situações opostas. Uma mulher que machucava a si mesma e depois chamava a polícia para denunciar o marido por agressão.

Há mais casos de violência doméstica em famílias latinas do que inglesas?

São tipos diferentes de violência. A comunidade inglesa sofre mais com a violência financeira. Há muitos casos de ameaças relacionadas ao status de imigração da vítima. Já nas comunidades latinas como a brasileira, a violência física é mais comum.

Você consegue ajudar todos que a procuram?

Eu não falo não. Quem me procurar (pelo meu Instagram @marciamccusker), eu vou ajudar. Recentemente, recebi 19 ligações em um único dia. Também falo italiano e espanhol, então ajudo não apenas brasileiros.

Quais são seus planos?

Meu objetivo é fazer funcionar a Wings of Soul, organização já registrada e na qual tenho a ajuda e parceria de advogados de imigração e da família, como Márcia Blu. Será uma entidade focada na defesa das vítimas de violência doméstica no Reino Unido.

Uma das nossas propostas, que apresento ao governo britânico, é a de criar um prédio para acolher as vítimas, não só mulheres, mas também homens, trans, idosos e crianças. Um lugar que possa ser usado como apoio para o recomeço dessas pessoas.

Quem paga os custos das suas ações de socorro?

Até hoje, tudo que faço pago com meu próprio dinheiro. Dia desses fiz a mudança de uma mulher e seu filho com meu próprio carro. Fiz sete viagens. Eu ajudo e dou força para que essas pessoas denunciem. Já fui processada, já fui ameaçada de morte. Já rodei 500 milhas para socorrer uma pessoa. Dia desses, eu tinha £ 83 na conta e transferi £ 80 para uma pessoa que precisava. Ajudar é muito bom.

Você tem o apoio da sua família nessa jornada?

Sim. Estou casada com o Steven, que é irlandês, e ele me dá muito apoio. Em um fim de semana recente, precisei socorrer três vítimas. Ele entende. E tenho a companhia do meu cachorro J.J. que está sempre comigo.

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